A importância da conservação no surgimento e reemergência de zoonoses

Crédito
Thamara Santos de Almeida e Marcia Chame

Registro SISS-Geo no. 22197 em 03/10/2021  
Macaco prego ou Capuchinho, Sapajus libidinosus (Spix, 1823) 
Colaborador: Zoo da Capivara 
Local: Coronel José Dias/PI

A destruição e a ocupação humana dos habitats naturais, o tráfico de animais silvestres, contaminações ambientais, alteração nos cursos dos rios, mudanças no clima, entre outras alterações, podem facilitar a transmissão de microrganismos para diversas espécies. Isso porque a destruição ou degradação dos ambientes naturais aproximam pessoas, animais de criação e de estimação dos vetores e dos microorganismos que lá estão. Para que um agente infeccioso consiga ganhar a capacidade de parasitar um novo hospedeiro, incluindo os humanos, são necessárias algumas condições e muitas oportunidades.

Nos últimos anos, o Brasil tem sofrido com o crescente número de problemas ambientais, como o perdão de dívidas de desmatamento ilegal e outros crimes, a expansão da agricultura intensiva, incêndios criminosos, flexibilização de leis ambientais, liberação de agrotóxicos, enfraquecimento de instituições ambientais e cortes de verbas para financiar a pesquisa científica. Além do aumento da desigualdade social, o perigoso negacionismo científico torna ainda mais preocupante e difícil o entendimento da necessidade da conservação da biodiversidade como fator de prevenção ao surgimento de zoonoses. Compreender e comunicar como o ritmo de destruição ou de atividades e comportamentos que simplesmente não consideram seus prejuízos à saúde reduz as chances de buscarmos alternativas e ações de prevenção e controle de novas epidemias e pandemias. 

Segundo o MapBiomas (projeto que busca mapear o uso e cobertura do solo nos últimos 35 anos no Brasil), a Amazônia perdeu, entre 1985 e 2020, 44,5 mil hectares de floresta nativa, o que corresponde a uma área de nove vezes o estado do Rio de Janeiro. Estudos realizados pelo Instituto Evandro Chagas no Pará (2001) já identificaram mais de 150 vírus transmitidos em sua maioria por vetores na região e apontaram o desmatamento, modificações no uso do solo (por exemplo, mineração), construção de hidrelétricas e rodovias, urbanização e colonização humana como as maiores ameaças ao surgimento e reemergência de arboviroses. Outro levantamento que reúne diversos estudos publicados em 2020 mostrou como o desmatamento pode criar uma tempestade perfeita para o surgimento dessas doenças.

O conceito de Saúde Única afirma que a saúde humana depende de ambientes e biodiversidade conservados. Essa relação de interconexão foi demonstrada recentemente na revista Nature, em artigo que mostra que hospedeiros conhecidos por compartilhar agentes infecciosos estão presentes em maior número de espécies e quantidade em locais alterados pelos humanos, com atividades de urbanização e agricultura extensiva, por exemplo, do que habitats não perturbados. Isso acontece porque a simplificação desses locais acaba diminuindo a biodiversidade, sobrando só as espécies que são mais oportunistas e melhores transmissoras e amplificadoras desses agentes infecciosos. Portanto, ações de conservação também podem colaborar na prevenção de zoonoses.